quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Crítica: Rock of Ages: O Filme


Faltou o rock'n roll


Considerado um período menos profícuo da história do rock, os anos 80 são o plano de fundo do satírico musical Rock of Ages: O Filme (Rock of Ages). Com direção de uma figura experiente no gênero, Adan Shankman (de Hairspray – Em Busca da Fama e de alguns episódios da série Glee), o filme é composto por diversas números musicais baseados em sucessos da época, como I Want to Know What Love Is e I Love Rock'n Roll.

Com trajetória na música country, a atriz Julianne Hough dá vida à Sherrie, uma jovem do interior do Oklahoma que viaja até Hollywood com o sonho de se tornar uma cantora famosa. Logo ao ingressar na cidade, a garota é assaltada; porém, recebe apoio de Drew (Diego Boneta). Funcionário da famosa, mas decadente casa de shows The Bourbon, o garoto também ambiciona se tornar um rockstar. Em crise financeira, o local é palco do último show da popular banda Arsenal, liderada pelo excêntrico Stacce Jaxx (Tom Cruise). No entanto, sob comando da primeira-dama Patricia Whitmore (Catherine Zeta-Jones), um grupo de mulheres ultraconservadoras clama “Clean the Sunset Strip”. O enredo ainda conta com os personagens Dennis Dupree (Alec Baldwin), proprietário da The Bourbon; Lonnie (Russell Brand), funcionário da casa de shows; Constance Sack (Malin Akerman), repórter da Rolling Stone; Justice (Mary J. Blidge), dona da boate de striptease Venus Club; e o empresário Paul (Paul Giamattoi).

Baseado na peça homônima de Chris D'Arienzo, o longa-metragem é composto de poucos momentos sem música, mas contém raras coreografias. Em geral, a dança é produto da montagem repleta de cortes rápidos. No entanto, há alguns momentos de exceção, como, por exemplo, quando o grupo liderado pela primeira-dama canta e dança Hit Me with Your Best Shot. Em contrapartida, todos os personagens que tem alguma expressão na trama cantam, inclusive, um funcionário do The Bourbon que sequer sabe falar em inglês. Já dotadas de letras meio bregas, as músicas adquirem um tom ainda mais meloso ao serem cantadas num ritmo muito próximo ao pop.


A fotografia muito luminosa aliada ao cenário e aos figurinos coloridos dão um tom ainda mais teen à obra. A intenção dos realizadores parece ser a sátira, mas eles pegam tão pesado que quase gera dúvidas. O casal de protagonistas é, inclusive, uma ode ao clichê. Há, por exemplo, uma fala sobre o fato de que a garota, na verdade, não viajou em busca de sucesso, mas de um grande amor. Tudo isso é permeado por piadas pastelão, escrachadas e, por vezes, escatológicas. O próprio Tom Cruise parece se esforçar, mas o personagem não ajuda, apesar de lembrar seu eu fictício de Magnólia (Magnolia, 1999) numa versão piorada.


Apesar de ser dotado de algumas ideias interessantes, mas nem tão criativas, como a hipocrisia da primeira-dama e do prefeito, o filme se perde na sua proposta. Com exceção de um ou dois momentos (como a da piada de que ser stripper é menos pior que ser de uma boy band), a obra se mostra boba e irritante. Pelo visual, pelos personagens bobos, pelo casal meloso, pelo enredo raso, Rock of Ages está muito mais para High Scholl Musical do que para um musical rock'n roll. Por menos rebelde e original que os anos 80 possam ter sido, eles não mereciam semelhante lembrança. Uma frase comentada à exaustão durante a história poderia ser verdade se dependesse dessa obra, “rock is dead”.

Rock of Ages: O Filme
Título Original: Rock of Ages
Ano: 2012 Estreia no Brasil: AGO/12
Direção: Adam Shankman
Roteiro: Allan Loeb, Chris D'Arienzo e Justin Theroux
Com: Alec Baldwin, Catherine Zeta-Jone, Tom Cruise, Paul Giamatti, Russell Brand, entre outros.
Duração: 123 minutos

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Recesso



As postagens de críticas ficarão suspensas nos próximos 10 dias, pois integrarei o Júri Popular do 40º Festival de Cinema de Gramado.

Abs
Priscila Mengue

sábado, 4 de agosto de 2012

Crítica: Violeta Foi Para o Céu



A pessoa por trás do mito


Um dos mais expressivos nomes da cultura chilena, Violeta Parra é a estrela da cinebiografia Violeta Foi Para o Céu (Violeta Se Fue a los Cielos). Agraciada com seis prêmios internacionais, a obra recebeu o Prêmio do Júri Oficial do Festival de Sundance 2012, na categoria cinema mundial de ficção. O roteiro é inspirado no livro homônimo de Angél Parra, filho da personagem título. A direção é, por sua vez, assinada por Andrés Wood, que já tinha cinco longas-metragens no currículo, dentre eles Machuca (Machuca), de 2004.

Estruturado de forma não cronológica, o filme retrata diversos momentos entre a infância e a morte da cantora, compositora e artista plástica Violeta Parra (Francisca Gavilán). Um dos grandes nomes da cultura chilena, a protagonista era uma dos tantos filhos de uma índia com um professor de música. Após tornar-se órfã ainda criança, resta-lhe apenas um violão velho pertencente ao falecido pai viciado em jogos de azar. Seu contato com a música começou ainda nos seus tempos de menina, quando acompanha seu progenitor, Nicanor Parra (Christian Quevedo) em modestas apresentações nos bares da região em que viviam. Após passar um tempo se apresentando em uma companhia, a personagem decide focar seu trabalho nas músicas tradicionais do país, dedicando-se a pesquisar o folclore chileno e adquirindo fama internacional.

Guiado por uma participação de Violeta em um programa de TV, a montagem mantém-se circular, não sendosonfusa apesar de misturar diversos períodos temporais. Como é esclarecido ao final, os acontecimentos são apresentados desta forma forma, pois são uma espécie de fluxo de lembranças da protagonista à beira da morte. A ênfase fica, portanto, nos momentos teoricamente mais marcantes da vida da artista: como a morte do pai, a apresentação na Polônia comunista, a morte da filha, o relacionamento com o suíço Gilbert Favre (Thomas Durand) e o insucesso do que ela almejava ser a Universidade Folclórica do Chile.


Além de não seguir uma linha temporal de acontecimentos, o longa-metragem também é repleto de montagens paralelas. Dentre elas, se destaca o momento em que é cantada Volver a los 17, pois são mostradas de forma intercaladas duas apresentações da atriz: uma para seu povo, na Tenda; e outra para a alta sociedade, em um prédio luxuoso. Esse momento funciona, portanto, como uma ilustração do ponto alto em que ela se encontra. No entanto, logo após o ápice da música, a personagem já leva seu primeiro golpe ao perceber que seu canto não foi suficientemente valorizado pela burguesia chilena. O segundo baque da compositora só ocorre mais tarde, mas é mais forte, pois dessa vez é o público que não a apoia suficientemente.

A construção do filme tem ainda como mérito um roteiro sem irregularidades, o qual mantém momentos significativos ao longo de toda a trama. O final é, aliás, possivelmente, o momento mais forte da história, pois simboliza os conflitos e as lutas de Violeta. Assim como diz sua canção El Gavilán, a protagonista que se mostrava tão forte poderia também ser frágil perante o homem. Para evidenciar a identificação da personagem com uma metáfora criada por ela mesma, permeia-se as cenas finais com o ataque fatal de um gavião a uma galinha. Aterrorizada, a ave tenta fugir do predador, mas ela não consegue resistir, sucumbindo nas garras do animal mais poderoso. De mesma forma, a artista se sente ao ser abandonada pelo amante Gilbert e ao perceber que as apresentações na tenda não têm mais condições de continuar.


Apesar de ser uma cinebiografia, o roteiro não caiu na tentação de mostrar uma figura quase maculada. A Violeta Parra desse filme tem diversas facetas, é humana. Mostra-se, inclusive, tanto aquela que expôs no Museu do Louvre quanto a que deixou um bebê de nove meses sob os cuidados de outra criança. Afinal, a determinação da protagonista não é mostrada com idolatria, mas sim evidenciando os conflitos dessa mulher que tanto sofreu, teimou e se dedicou por ideais, convicções e desejos.

Centrado na personagem principal, o filme encontrou uma base extremamente sólida na interpretação de Francisca Gavilán. A chilena de 39 anos deu corpo e voz à protagonista, parecendo-se muito com a personagem principal. O trabalho de canto da atriz foi, inclusive, bastante eficaz, pois não fugiu às características do estilo de Violeta. Isso possibilitou, portanto, que não fosse necessário o uso de imagens e sonoras de arquivo, o que poderia gerar danos à coesão da trama.


Repleto de belas paisagens, a obra conta ainda com uma fotografia crua e carente de colorido. Os momentos no Chile foram mostrados em meio a uma atmosfera terrosa, enfatizando o pouco luxo das instalações. No entanto, em alguns momentos, as imagens em cor são substituídas pelo preto e branco oriundos teoricamente de uma câmera doméstica manejada em cena e de imagens de televisão. Com o intuito de evidenciar os sentimentos da protagonista, o filme é repleto de closes no rosto, em especial, nos olhos de Violeta. A exposição frequente de sua face funciona quase como um convite para adentrarmos na alma da personagem. A trilha sonora é, por sua vez, composta basicamente pelas músicas da figura principal, sendo a imensa maioria delas executadas dentro da própria história.

Violeta Foi Para o Céu é, enfim, uma interessante e emocionante narrativa de uma forte mulher latina. Muito mais do que um mito da cultura, mostrou-se os conflitos de um ser humano que persistiu o quanto pode. Com uma excelente atuação principal, uma trilha interessantíssima e um enredo bem construído, o filme vai muito além da mera documentação. As diversas qualidades da obra possibilitam, portanto, que mesmo o público que desconhece Violeta Parra aprecie o longa-metragem.

Violeta Foi Para o Céu
Título original: Violeta se Fue a los Cielos
Ano: 2011 Estreia no Brasil: Jul/2012
Direção: Andrés Wood
Roteiro: Eliseo Altunaga
Com: Francisca Gavilán, Thomas Durand, Christian Quevedo, entre outros.
Duração: 110 minutos

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Crítica: Bel Ami - O Sedutor


Pouco convincente galanteador conquista Paris


Dirigido pelos estreantes Declan Donnellan e Nick Ormerod, Bel Ami - O Sedutor (Bel Ami) é uma adaptação do romance homônimo de Guy de Maupassant, escrito em 1885. Apesar de outros realizadores já terem se baseado no livro, nenhuma versão cinematográfica teve repercussão satisfatória. No entanto, outros trabalhos do escritor tiveram caminhos mais bem sucedidos no cinema, como as obras Masculino Feminino (Masculin Féminin), de 1966, Um Dia no Campo (Partie de Campagne), de 1936, e Uma Mulher Sem Amor (Uma Mujer Sin Amor), de 1952, dirigidas respetivamente por Jean-Luc Godard, Jean Renoir e Luís Buñuel. O último lançamento inspirado nos escritos do francês não integra, contudo, esse grupo, pois é uma obra fraca, carente de um bom roteiro e protagonista. Falado em inglês, o longa-metragem tem um título alusivo a um apelido dado ao protagonista pela filha de uma de suas amantes.

Ambientada na Paris do final do século XIX, a trama aborda a ascensão social de um marginalizado ex-combatente da Guerra da Argélia, George Duroy (Robert Pattinson). Ao visitar uma espécie de bordel, o protagonista encontra um antigo colega do exército, Charles Forestier (Philip Glenister) o qual exerce um papel de destaque num importante jornal. O personagem principal é, então, convidado para um jantar no qual é apresentado a três mulheres que possibilitarão mudanças na sua vida: Madeleine Forestier (Uma Thurman), esposa do anfitrião; Virginie Rousset (Kristin Scott Thomas), casada com o dono do periódico; e Clotilde de Marrele (Christina Ricci), uma socialite também compromissada com um importante homem. Durante a refeição, a esposa do dono da casa sugere ao visitante que escreva artigos sobre suas experiências em Argel. Semi-analfabeto, o protagonista produz seus textos com ajuda de Madeleine, a qual praticamente faz tudo sozinha. Aos poucos, o personagem vai se envolvendo com as três mulheres, seja por paixão seja por ambição. No entanto, um baque na história o faz perceber que, na verdade, não passa de um objeto nas mãos das três damas.

Um dos grandes problemas do filme reside na escolha do ator principal, pois Robert Pattinson carece do charme, sensualidade ou qualquer outro fator que justificasse o fato de seu personagem deixar as mulheres em polvorosa. Além disso, sua atuação é exagerada, repleta de trejeitos faciais, como sobrancelhas levantadas e olhos esbugalhados. Talvez devido a isso e à competência das intérpretes, as atenções voltam-se para as três figuras femininas principais. Afinal, Uma Thurman consegue dosar as diversas facetas de Madeleine, assim como Christina Ricci encarna toda a sensualidade e a devoção de sua personagem e Kristin Scott Thomas traz, por sua vez, uma atuação que vai do recato ao passional.


Outro elemento pouco positivo do longa-metragem é o roteiro: os acontecimentos vão ocorrendo de forma enfileirada, sem muitas vezes haver uma premissa clara. Além disso, a descrição psicológica do personagem fica muito restrita a falas curtas sobre sua antiga vida no campo ou na guerra. Esse aspecto só não é mais prejudicado devido a alguns momentos em que é mostrado um percevejo andando sobre a cama do protagonista, evidenciado a fobia que o mesmo detinha contra a pobreza. Por fim, o plano de fundo político sobre a importância feminina e os esquemas pouco éticos é mal aproveitado, desenvolvendo superficialmente o contexto em que a história está inserida.

Em contrapartida, o cenário e o figurino parecem muito fiéis ao período retratado. No entanto, pecou-se em parte da composição visual do protagonista, que sofre poucas modificações na aparência mesmo após ascender economicamente. Afinal, não faz muito sentido que ele apresente, diferentemente dos outros homens da alta sociedade, largas olheiras, cabelos ensebados e uma pele com aparência pálida, quase doentia. Já a trilha sonora é basicamente instrumental, atendo-se a um ritmo parecido com o usado em filmes de suspense.

Bel Ami - O Sedutor é, enfim, uma obra de poucas qualidades. Talvez as coisas pudessem ser diferentes se o elenco contasse com uma figura masculina forte, algum Alain Delon do século XXI. No entanto, como nem tudo são defeitos, o filme conta com ótimas interpretações femininas, que trazem um brilho à trama.



Bel Ami - O Sedutor
Título Original: Bel Ami
Ano: 2012                    Estreia no Brasil: ago/12
Direção: Declan Donnellan e Nick Ormerod
Roteiro: Rachel Bennette
Com: Roberto Pattinson, Uma Thurman, Christina Ricci, Kristin Scott Thomas, entre outros.
Duração: 102 minutos

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Crítica: Aqui é o Meu Lugar


Em vez de fama, este rockstar busca autoconhecimento


Ao telefone, um personagem conversa com a esposa. Num determinado momento, ela questiona se ele está tentando se encontrar. Em resposta, o protagonista diz que está no Novo México, não na Índia. No entanto, por mais aguda que seja a fala do eu fictício, Aqui é o Meu Lugar (This Must Be the Place) é justamente a jornada de autoconhecimento de um homem que vivia assombrado por acontecimentos do passado.

Mantendo-se da renda que construiu durante seus anos de fama, o ex-rockstar Cheyenne (Sean Penn) leva uma vida pacata em sua mansão localizada em Dublin (Irlanda). Há 30 anos longe dos palcos, o homem de visual andrógino parece cansado de viver: seus movimentos são lentos e sua fala é pausada e rouca, dando uma aparência fragilizada ao personagem de maquiagem forte e cabelos desgrenhados. No entanto, seu cotidiano entediado sofre uma mudança brusca quando ele é avisado que seu pai está à beira da morte. Devido ao medo de viajar de avião, o personagem vai até Nova Iorque de navio, mas chega tarde demais. Após o enterro, ele descobre que seu progenitor esteve preso em Auschwitz durante a II Guerra e, em busca de vingança, teria dedicado o resto de sua vida em busca do nazista que o torturou. Apesar da relação difícil que mantinha com a família, o protagonista decide ir à procura do algoz de seu pai, iniciando uma viagem por diversos cantos dos Estados Unidos.

Ao longo do filme, são apresentados vários personagens, sendo dois deles muito expressivos na vida da figura principal: a esposa Jane (Frances McDorman) e a jovem amiga Mary (Eve Hewson). Casada com o protagonista há 35 anos, a bombeira é a pessoa dominante na relação. Isso fica evidente no contraste das personalidades, pois ela é cheia de energia, extrovertida e atlética enquanto que seu cônjuge é apático, introvertido e vítima de dores musculares. Já a amizade com a adolescente evidencia alguns ressentimentos advindos do passado. Cheyenne se tornou famoso por suas músicas depressivas, as quais teriam culminado no suicídio de dois fãs. O fato de que isso também possa acontecer com Mary o preocupa tanto que ele decide tentar juntá-la com o jovem e apaixonado Desmond (Sam Keeley).


Agraciado com o Prêmio do Júri Ecumênico do Festival de Cannes 2011, Aqui é o Meu Lugar é o quinto longa-metragem do diretor Paolo Sorrentino. Vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Cannes 2008 por O Divo (El Divo), o cineasta é o principal expoente do chamado Risorgimento, uma geração de realizadores que está trazendo o tradicionalíssimo cinema italiano de volta aos holofotes. O título original do filme é proveniente da música homônima da banda Talking Heads, cujo ex-vocalista, David Byrne, faz uma participação especial no longa-metragem. O show do roqueiro é, inclusive, um momento ímpar dentro da trama, pois é construído de uma forma muito inteligente, com um cenário de fundo que se movimenta durante a apresentação. Além dessa cena, a canção título aparece em várias outras situações e em diversas versões e vozes.

O filme peca, no entanto, no excesso de subtramas como, por exemplo, o sumiço do irmão de Mary e o interesse da banda The Piece of a Shit em ser produzida pelo protagonista.  Essas situações ficam deslocadas, pois não acrescentam sentido à história, somente atrasando o início da jornada do personagem. A extensão excessiva da introdução prejudica o desenrolar do enredo, dando uma ideia de falta de planejamento de seus roteiros. Afinal, o estilo road movie só começa algumas dezenas de minutos após o início da obra. Em contrapartida, as figuras que surgem no decorrer da viagem aparecem de forma rápida, mas acrescentam elementos importantes para o aprofundamento da narrativa.


Apesar de apresentar diversos eu fictícios, Aqui é o Meu Lugar é Cheyenne. Todos os são, na verdade, elementos catalisadores de emoções. Uma das falas de outra figura fictícia, Ernie Ray (Shea Whigham), evidencia um pouco de quem é o protagonista. O homem diz que tem um cão que é manso com todos, mas que, no fundo, é cheio de agressividade. De certa forma, é isso que ocorre com o roqueiro: ele tenta disfarçar suas evidentes angústias oprimindo-se de tal forma que sua raiva somente é demonstrada contra uma mecha de cabelo que teima em cair sobre seu rosto.

Com inspiração no vocalista do The Cure, Robert Smith, o personagem de Sean Penn é dotado de naturalidade, fugindo a qualquer tipo de estereótipos caricaturais. Para dar contraste ao visual pesado, optou-se por uma interpretação pausada, com movimentos lentos, dando fragilidade e expondo a tristeza de Cheyenne. Visando enfatizar as mudanças do personagem, o início do filme é composto de diversos planos em que a movimentação de câmera é devagar, sendo composta até mesmo de alguns slow motions. Já a fotografia aposta no contraste, em que um roqueiro todo de negro parece deslocado no ambiente muito iluminado e repleto de cores quentes. Dentro da composição visual, destaca-se o fato de que a maioria dos personagens terem olhos azuis: Cheyenne, Jane, Mary, a mãe de Mary (Olwen Fouere), o caçador de judeus Monderclai Midler (Judd Hirsch), a garçonete Rachel (Kerry Condon).


No entanto, mais do que qualquer elemento técnico, o destaque do longa-metragem são as falas, em especial as de Cheyenne. Apesar de curtos, os diálogos do personagem são ácidos, contrastando também com a vagarosidade de sua voz. Há discursos de teor cômico como, por exemplo, quando afirma que o primo usa dentadura, pois os dentes dele seriam perfeitos demais para serem reais.  Em contrapartida, também há frases tristes como uma expressão advinda do diário do pai, em que o mesmo diz que há diversos tipos de morte e o pior deles é continuar vivendo.

Aqui é o Meu Lugar é um road movie diferente: seu protagonista viaja em um carro de luxo e anda a maior parte do tempo em companhia de uma mala de rodinhas. Além disso, diferentemente da maioria dos filmes do gênero, a estrada e os locais têm pouca importância. Não se trata, portanto, de uma jornada em que o autoconhecimento está relacionado a novas experiências e aventuras, mas sim a escolhas e reflexões a respeito do passado. A nova obra de Sorrentino é, enfim, a história de um homem que não se adequou ao passar do tempo porque estava preso aos arrependimentos da juventude.

Aqui é o Meu Lugar
Título original: This Must Be the Place
Ano: 2011                   Estreia no Brasi: Jul/2012
Direção: Paolo Sorrentino
Roteiro: Paolo Sorrentino e Umberto Contarello
Com: Sean Penn, Frances McDormand, David Byrne, Judd Hirsch, entre outros.
Duração: 118 minutos